segunda-feira, 26 de junho de 2017

Assassin's Creed II



Originalmente publicado em 6 de novembro de 2012

O site Mundo Canibal publicou uma minúscula série de vídeos chamada “Game Novela” por volta de 2008. O vídeo que se tornou mais famoso foi o do “Treco Narrando a Treta do Strit Fáiti”, mas o outro consistia num gameplay do primeiro Assassin’s Creed dublado com uma pequena historinha sobre o protagonista Altaïr perseguindo um tal de Paulão, que supostamente teria comido sua irmã. Muitas risadas foram dadas com esse vídeo. Imagine agora minha surpresa ao notar que uma das primeiras missões de Assassin’s Creed II era EXATAMENTE isso, o novo protagonista Ezio Auditore da Firenze indo atrás de um cara que traiu sua irmã. Ainda mais risadas foram proferidas.

Mas não só risadas: essa missão também demonstra uma das grandes melhorias da sequência sobre o original: você se importa com os personagens o suficiente para curtir encher o traíra de porrada. Altaïr tinha toda a personalidade de um tijolo com um sotaque americano ridículo no meio dos árabes. A primeira cena de Ezio é seu nascimento, e desde então você acompanha sua vida como valentão e galanteador nas ruas de Florença até a morte de todos os homens de sua família, incluindo seu irmãozinho menor, por culpa de uma conspiração dos Templários para tomar o controle das cidades italianas. E Ezio não tem o menor problema com carisma. Apenas seu sotaque italiano (o qual eu gostaria muito de saber se os próprios italianos não acham ridículo) já é magnético por si só.



Ezio também é acompanhado por um elenco de personagens que também passaram pelo tratamento de carisma. Até mesmo os familiares de Ezio que são mortos durante as missões de treinamento são introduzidos de maneiras legais, seu pai fingindo lhe dar um sermão sobre as brigas e a invasão do quarto de uma moça, por exemplo (“Suas ações são inaceitáveis! Elas me lembram... de mim mesmo quando eu tinha a sua idade!”). É muito interessante como o jogo também cruza figuras que existiram na vida real com a história doida de Assassinos x Templários. Leonardo da Vinci se torna um dos principais coadjuvantes, e uma das missões mais divertidas do jogo envolve pilotar um protótipo de máquina voadora construída por ele. Niccoló Machiavelli também aparece como um dos chefes dos Assassinos, e o personagem que inclui Ezio finalmente na Ordem dos Assassinos. Rodrigo Borgia aparece como vilão principal, e se torna Papa no decorrer do jogo, assim como na vida real.

Mas assim como o primeiro game, Assassin’s Creed II não é realmente sobre conspirações e política na Itália na época do Renascimento, e sim sobre um babaca nos tempos atuais chamado Desmond Miles, que passou todo o primeiro game dentro de uma máquina que o permite reviver as memórias de seus antepassados. Ele terminou aquele jogo num cliffhanger terrível, onde ele começava a enxergar coisas pintadas na parede como se tivesse a visão de águia que seus ancestrais também tinham em suas épocas. E isso tem um motivo: Lucy, a mocinha que trabalhava na Abstergo Industries, fachada atual para os Templários (juro, fica mais complicado que isso) é na verdade uma assassina, que resgata Desmond de seu cativeiro e o leva para um esconderijo onde novos personagens são introduzidos e ela pretende ligar Desmond a outra máquina para se aproveitar do “Bleeding Effect”, ou seja, fazer Desmond adquirir as habilidades de um assassino revivendo as memórias de Ezio. Felizmente, ao contrário do primeiro game, passamos muito menos tempo com Desmond e a gangue do Scooby-Doo, e o jogo se foca quase que completamente nas missões com Ezio. Para seu crédito, a gangue do Scooby-Doo conta com um inglês chamado Shaun, misantrópico e sarcástico, que tem os comentários mais engraçados do jogo.



A falta de recursos dos assassinos em contraste com a grande empresa que é a Abstergo Industries talvez explique algumas coisas, como por exemplo, por que Assassin’s Creed II tem sérios problemas com pop-in de texturas e objetos, coisa que não acontecia no primeiro game. Isso acontece em qualquer máquina, pois já testei esse game tanto numa máquina Core 2 Duo + 9800GT quanto na atual Core i7 + GTX 580, e pessoas ainda aparecem do nada quase na cara de Ezio enquanto ele corre pelas ruas da cidade. Detalhamento de sombra também diminuiu consideravelmente, sendo possível ver os quadrados que as compõem, mesmo em cenas mais próximas, no caso das cenas no tempo de Desmond. Felizmente, isso é compensado na direção artística, que resolveu diminuir a repetição horrível do primeiro game fazendo as cidades serem muito diferentes. Florença é claramente uma cidade, e Veneza é outra, com cores e disposição diferentes. Os canais de Veneza estão bem reconhecíveis, distinguindo ainda mais.

E no quesito da jogabilidade? Assassin’s Creed II prova que o primeiro game foi apenas um experimento que falhou. Primeiramente, avaliemos o que torna um jogo open-world interessante, que é o meio pelo qual nos locomovemos por ele, e essa já era uma das forças do original. Ezio é um atleta ainda mais eficaz que Altaïr, capaz de subir rapidamente por qualquer saliência em qualquer construção. Ele sobe mais rápido, ele corre mais rápido, ele é um espécime superior a Altaïr. Ainda existem certos problemas de controle quando navegando em plataformas mais estreitas, onde Ezio ainda pode decidir que a direção para onde você apontou é totalmente diferente da que você realmente apontou, o que pode levar a falhas de missão em algumas ocasiões, mas não é nada muito grave. E um enorme bônus: ao contrário de Altaïr, Ezio não é solúvel em água, ele consegue nadar pelos canais de Veneza, o que facilita muito o trabalho.

As missões agora são muito mais dinâmicas, ainda que seguindo basicamente o mesmo padrão das do original. Por exemplo, lembram-se das missões onde você tinha que ficar sentado num banco ouvindo uma conversa? Era chato pra cacete, mas agora seus alvos andam pelas ruas e é sua obrigação acompanhá-los sem ser detectado, ou seja, usando os telhados e saliências para manter os alvos na sua linha de visão e numa distância segura. Há maior variedade de missões, envolvendo corridas pelos telhados, combate, e claro, assassinatos, que são muito mais frequentes.



De fato, às vezes era fácil se perguntar se Altaïr era realmente um assassino ou um herói de ação genérico. Ezio é claramente um assassino. Várias das missões envolvem se infiltrar sem ser detectado num local restrito e passar sua lâmina escondida na garganta de um templário infeliz, e essas são facilmente o ponto alto do jogo, mesmo que subterfúgio não seja exatamente fácil ou mesmo encorajado pelo jogo. E Ezio tem um número enorme de ferramentas para tal. Agora com uma lâmina em cada braço, matar dois guardas próximos um do outro é simples e fácil. Pular de dentro de um monte de feno enfiando a lâmina nas costas de um guarda e rapidamente o escondendo no monte de feno, não tem preço. Além de poder cobrir a lâmina com veneno, usar facas jogáveis a distância, poder jogar moedas no chão para causar comoções populares e distrair os guardas, usar bombas de fumaça, e até mesmo uma pistola escondida junto com as lâminas, inventada por Leonardo da Vinci, claro.

Se você for descoberto, a luta de espadas é sua saída, e esta não teve suas mecânicas mudadas, mas soldados inimigos agora não podem ser facilmente mortos por constantes “counter kills”. Eles agora podem se defender de contra-ataques, e vêm em variedades diferentes, alguns mais rápidos e armados com adagas, alguns cobertos de armadura pesada e vulneráveis apenas ao seu novo movimento de desarmar, que é a única maneira de conseguir uma arma grande e pesada o suficiente para vencê-los. Isso torna o combate mais difícil, e francamente, encoraja que você fuja ao invés de enfrentar grandes números de soldados, o que é mais tenso, excitante e divertido.

Uma das adições mais interessantes ao conjunto de Assassin’s Creed II são as tumbas. Basicamente, Altaïr deixou para o futuro da Irmandade a sua armadura, que é a melhor do jogo. Ela fica trancada debaixo do HQ dos Auditore, protegida por seis estátuas que só se abrem com a inserção de selos. Esses selos estão localizados em tumbas pelas cidades da Itália, e essas são a influência de Prince of Persia escrita em código. Cheias de áreas secretas e oportunidades para o melhor estilo de Parkour, essas tumbas são as partes mais divertidas das novas interações.



Provando mais uma vez que a Ubisoft talvez tenha ficado envergonhada com o fato de que o primeiro Assassin's Creed não tinha muita coisa diferente pra fazer, mais uma coisa ainda resta: o coitado que estava na máquina da Abstergo antes de você, chamado apenas pelo seu número, Subject 16, deixou algum tipo de mensagem para Desmond, codificada dentro do programa da máquina. Então, em alguns lugares do jogo, um símbolo pode aparecer pintado nas paredes brilhando, quando visto com a visão de águia, e cada um desses símbolos envolve resolver algum pequeno enigma, geralmente não muito difícil (os três últimos deram um pouco mais de dor de cabeça, mas nada muito cabuloso) e que abre um pequeno pedaço de um vídeo que promete explicar toda "A Verdade". Altas promessas, que no final não são muito bem cumpridas, mas os enigmas são interessantes e alimentam ainda mais a atmosfera das teorias de conspiração que funcionam como o núcleo da história de Assassin's Creed II.
Infelizmente, algumas coisas antigas ainda não funcionam, e algumas novas também não. As missões principais são todas bem variadas e interessantes, mas as missões extras são bem repetitivas. Vêm em três tipos: corridas, eventos de “beat up” (basicamente a missão mencionada no começo do texto de novo e de novo e de novo), e contratos de assassinatos. Estes são interessantes por levarem em consideração que Ezio é um assassino, mas de qualquer maneira, são mais de 20 missões basicamente iguais, que não avançam a história em nenhuma maneira e não tem nenhuma recompensa a não ser dinheiro.

Sim, Assassin’s Creed II tem um sistema econômico, mas que é basicamente inútil. Esse dinheiro pode ser usado para reconstruir a Villa Monteriggioni, quartel-general dos assassinos, para que este tenha lojas que ofereçam descontos em novas armaduras e armas, e também gerar um lucro, como os negócios de GTA: Vice City, que é recebido na Villa a cada 20 minutos. Problema número 1: comprar novas armaduras e armas é inútil, pois qualquer arma funciona contra qualquer inimigo, e se você fugir das lutas, não vai precisar de pontos de vida. Além do mais, as melhores armas e armaduras do jogo são as de Altaïr, que você consegue apenas completando as tumbas. Problema número 2: o jogo fica te enchendo o saco pra ir buscar o dinheiro a cada 20 minutos na Villa, para que você invista na própria Villa e ganhe ainda mais dinheiro. E depois faz o que com o dinheiro? Vira o Tio Patinhas, constrói uma piscina de dinheiro e nada dentro dela?



Mas no geral, Assassin’s Creed II é uma melhora enorme sobre seu predecessor. Introduz personagens mais interessantes, conta uma história mais interessante, e tem elementos de jogabilidade muito mais interessantes. Mas um alerta: o final dá uma de Matrix Reloaded, introduzindo um novo personagem e um novo conflito nos últimos cinco minutos de jogo, mudando completamente o que você sabia sobre a história do tempo atual e também mandando toda a lógica pra puta que pariu. Isso varia conforme a tolerância do jogador, mas pra mim que passou pelo final de Lost e pelo final de Mass Effect 3, é um tanto quanto duro de engolir.

Ufa. Só faltam mais dois jogos inteiros para completar a minha missão de terminar todos os games da série antes do lançamento de Assassin’s Creed III para PC. Vamos que vamos.

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